Sekola e melaka
Existe um portugalinho na Malásia. Chama-se Melaka – em malay, a língua nacional da Malásia, língua que utiliza o alfabeto romano.
Come-se bacalhau – em pastéis ou cozido com batatas – dança-se ao som de músicas tradicionais – o malhão, o corridinho - venera-se Nossa Senhora de Fátima, reza-se nas igrejas católicas e tudo isto num país que tem o Corão como bíblia de estado.
Os portugueses são recordados com muita simpatia em Melaka (Malaca), ao contrário de outros colonizadores cruéis, como os japoneses.
E, segundo dizem alguns, os portugueses deixaram por estas paragens a maior herança que um povo pode deixar a outro: o conceito de escola (sekola).
Trazida pelos padres jesuítas, criada para formar marinheiros que lessem cartas e ajudassem a navegar as costas asiáticas, não se sabe ao certo. Mas parece que foi de Melaka que o conceito – e a pronúncia – de escola irradiou por todos os reinos malaios hoje agrupados na Malásia moderna.
E se calhar foi essa tradição arreigada nas almas e nos corações que levou Mahatir Moahmad, ex-primeiro ministro, a decretar que o investimento na educação – ou como ele gosta de dizer, na “aquisição de conhecimento”, atingisse 25% do orçamento do estado malaio. Sim, 25% do orçamento do estado malaio é investido na educação e na formação.
Por isso, a Malásia distingue-se por ter o melhor capital humano dos países da Ásia e por isso também a Malásia – seguindo um modelo contrário ao preconizado pelo FMI – atingiu patamares de desenvolvimento económico e social absolutamente fantásticos em menos de trinta anos.
O que terá a tal escola de Melaka, fundada pelos jesuítas, a ver com isto?
Se calhar tudo, provavelmente, nada.
Passo a explicar.
A iniciativa descobridora dos portugueses, por razões decerto não filantrópicas mas reais e concretas, levou à criação de uma escola, com todo o sentido que a escola tem: alunos, mestres, aquisição de saberes e conhecimento, ferramentas, método, estrutura, realizações, rituais, concretizações.
Esse espírito de escola – pois a escola é acima de tudo um estado de alma – provou a sua eficácia e foi difundido e espalhado por outros reinos.
Essa difusão conduziu á consciência da importância da aquisição de conhecimento.
A aquisição contínua de conhecimento levou ao desenvolvimento.
Mas a ideia de escola ficou. E, a ser verdade tudo o que antecede, à colonização do sul de Portugal por Al-Andaluz, respondemos com a criação de uma escola em Malaca que se espalhou, que frutificou, que se desenvolveu. Mas que ainda se chama “sekola”, como nos primórdios.
E que hoje também se chama universidade – o espaço do conhecimento universal.
E que hoje também se deveria chamar proximidade apesar da distância.
Da escola de Malaca à “sekola” moderna, um percurso que, apesar de tão distantes fizemos juntos, portugueses e malaios.
E que devíamos retomar sob pena de deixarmos a história rescrever-se e afundarmos no esquecimento tudo aquilo que já partilhámos e construímos e que está registado nos anais dos sentimentos.
Quando visitei a Universidade Tecnológica Mara – no passado mês de Agosto de 2006 – uma universidade que tem cerca de 150.000 alunos, que ensina somente em inglês e que tem uma Faculdade de Gestão Cultural com 10.000 alunos, imaginei-me na “sekola” de Melaka, junto ao mar, cinco séculos antes.
E não vi grandes diferenças entre uma e outra.
Não sei se foram os meus olhos, o meu coração ou a minha alma que se confundiram, mas a escola era a mesma.
E vi Portugal e vi portugueses, isso afirmo categóricamente.
terça-feira, 5 de fevereiro de 2008
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