terça-feira, 17 de junho de 2008

O Modelo do Avião

Lembra-se da adrenalina a subir – ou do medo – quando o avião começa a descer e se prepara para aterrar? Quando se ouvem aqueles barulhos esquisitos e começamos a pensar que se passa alguma coisa de errado?
As mãos estão suadas e ajeitamos o corpo na cadeira ao mesmo tempo que olhamos pela janela, não vá o diabo tecê-las.
Faz-se um silêncio enorme na cabina e toda a gente está hirta e tensa. Entretanto, o que é que acontece no «cockpit» do avião? Mais ou menos o seguinte, que o espaço da crónica não dá para grandes devaneios:
«Flaps one», diz o PIC-Pilot in Comand depois de verificar que o avião está estabilizado por cima do «localizer». O PNF-Pilot not Flying acciona a alavanca que faz com que os flaps do avião se estendam um grau. Começam a ouvir-se os motores dos «flaps» e é visível a quem viaja por cima da asa a movimentação dos mesmos.
«Gear Down», diz o PIC. Novamente o PNF acciona a alavanca respectiva e os trens de aterragem do avião começam a tomar a posição devida. Ouvem-se os estalidos característicos da abertura dos alçapões e do estiramento dos trens de aterragem dianteiro e do nariz.
Mais ou menos em simultâneo com estas instruções, que só se iniciam após a «check-list» do «setup» de aterragem ter sido verificada , o PIC reduz a velocidade do avião para os valores que lhe foram dados pelo computador de bordo , equacionando as variáveis de vento, peso e condições da pista. Dá novas ordens de extensão dos «flaps» – Flaps 15, Flaps 30, e, nalguns casos, Flaps 40.
Configura-se o sistema automático de travagem de acordo com as características do avião e as limitações impostas por aquele aeroporto específico.
Ao longe já se vê uma fina tira de alcatrão, a pista de aterragem, completamente alinhada com o nariz do aparelho. Até que o avião toque com as rodas no solo, sucedem-se, de forma muito rápida, todas as operações que visam proporcionar aos passageiros uma aterragem em segurança, dentro dos limites operacionais do avião, das condições atmosféricas e do estado e características da pista.
Se esses limites estiverem para além do que é estabelecido pela companhia que detém o avião, ou se o PIC considerar que não existem condições de prosseguir a aproximação final – devido, nomeadamente, a uma alteração brusca das condições existentes – aborta a aterragem e segue para os aeroportos alternantes – estão sempre previstos dois – cujas coordenadas já estão inseridas no plano de voo desde a partida.
Objectivo: não colocar em risco os passageiros, o avião e a segurança de terceiros.
Apesar desta breve e incompleta descrição do que são os preparativos para a aterragem de um avião comercial , perguntam os leitores: O que é que os modelos de gestão das empresas têm que ver com os aviões?
Aparentemente, nada!
Do ponto de vista dos modelos de organização e gestão, tudo, pois o avião constitui o mais simples e eficaz modelo de gestão que existe, como irei demonstrar de seguida.
Para comprazer o meu amigo Carlos Perdigão, o avião constitui o mais «óbvio, prático e concreto» modelo de gestão conhecido, e todos sabemos a necessidade que as empresas têm de voltar a encontrar os caminhos da simplicidade e do senso comum.
Vejamos então, em detalhe e na óptica dos modelos de organização e gestão – pois não posso ignorar que sou Consultor de Gestão – o que se passa no avião:
a) foi construído para a função que desempenha, ou seja, tem o «layout» totalmente adequado no plano da forma e da tecnologia. Não tem mais nem menos do que necessita para cumprir a sua função. Tudo está optimizado;
b) tem um rumo que é conhecido «a priori». Sabe de onde parte e para onde vai. Reúne todas as informações sobre o percurso a percorrer e prepara antecipadamente alternativas caso as coisas não corram de acordo com o inicialmente previsto. Para o conseguir, consulta múltiplas fontes de informação e consolida-a em função do seu objectivo. A sua rota é sempre feita por etapas ;
c) a autoridade está perfeitamente definida. Independentemente das hierarquias funcionais, sabe-se sempre quem manda, inclusivé, o nome. Quem manda exerce de forma clara e perceptível essa autoridade;
d) existe uma proximidade total com os clientes. Sabem-se as suas necessidades e tenta-se satisfazê-las de imediato. Tudo está organizado para que o cliente sinta que não foi defraudado com o produto ou serviço que comprou;
e) as componentes estratégicas e operacionais estão devidamente separadas, não existindo o risco de quem tem responsabilidades estratégicas não as exercer, por não ter as competências devidas. Todos foram treinados de forma exaustiva para exercerem as suas funções;
f) o controlo de execução das tarefas que a cada um competem, é total, não existindo qualquer possibilidade de não serem exercidas. O controlo é parte integrante do modelo de organização e gestão;
g) o que não corre bem é devidamente registado para que possa ser corrigido, dentro de uma filosofia de que um incidente ocorrido uma vez não mais poderá repetir-se tendo as mesmas causas;
h) a comunicação entre todos os sectores é permanente;
i) o elemento lúdico está sempre presente;
j) todos têm uma reciclagem permanente das competências. Se não as exercerem por um determinado período de tempo, são impedidos de trabalhar, até que as readquiram novamente. Utilizam-se simuladores das situações reais para efectuar o treino;
k) os serviços de suporte estão totalmente ao serviço do negócio;
l) periodicamente, o avião é revisto para se verificar se continua em condições de cumprir a sua função, mesmo que esteja tudo a correr bem;
m) existe uma optimização total de recursos, não se consumindo mais do que os que são estritamente necessários. A optimização é permanente;
n) o avião tem um período de vida útil, após o que é substituído;
o) para se trabalhar no avião tem que se gostar e conhecer, pois a dureza da vida a bordo não se compadece com uma atitude meramente mercenária.
Já imaginaram os leitores o que seria se todas as nossas empresas adoptassem o Modelo do Avião, ou seja, o PMM – Plane Management Model? (chamo-lhe assim para criar «escola», pois inventei a sigla e o modelo foi aparecendo durante o meu trabalho como consultor em empresas aeronáuticas e através das conversas com o meu parceiro destas lides, o Jorge Marques, também ele cronista regular deste espaço)
Teríamos, decerto, empresas mais eficientes, mais orientadas para o negócio e os clientes, com lideranças claras exercidas por líderes competentes e treinados, que não desperdiçariam recursos, optimizadas, seguras, que tinham sempre alternativas previstas quando as coisas não corressem bem, que procediam a uma verificação/reverificação permanente dos seus métodos e processos, que treinavam os seus colaboradores de forma permanente e que usavam de forma eficaz a informação.
Será um sonho? Será uma antecipação do futuro?
Os leitores mais cépticos, perguntarão, será que funciona?
O Eng.º. Fernando Pinto, da TAP, tem vindo a demonstrar que sim, que é possível fazê-lo, pois não se pode ignorar um modelo que tem dado excelentes provas em todo o mundo e durante mais de cinquenta anos.
Afinal, andamos todos à procura do modelo de organização e gestão ideal para as empresas e já viajámos nele tantas vezes.
Porque não pensar nisto a sério?
A próxima vez que andar de avião observe com atenção tudo o que acabei de descrever.
Se calhar vai encontrar respostas para questões que o andam a preocupar. E já agora, quando olhar para o céu e vir um avião, imagine que a sua empresa também pode despertar aquele sentimento de contemplação e de sonho. Aplique o modelo do avião, ou se preferir uma designação mais sofisticada, o PMM – Plane Management Model.
Afinal, o melhor da vida são as coisas simples, práticas e concretas, não são?

1 comentário:

Luís Bento disse...

é um novo estilo do blogue. gostava que comentassem as fotos e os artigos.